Como Funcionava o Esquema
O epicentro da fraude, segundo o MP-SP, era o auditor fiscal Artur Gomes da Silva Neto, supervisor da Diretoria de Fiscalização da Sefaz-SP. Ele manipulava processos administrativos para agilizar ou inflar ressarcimentos de ICMS, supostamente em troca de pagamentos ilícitos. A operação usava a empresa Smart Tax, registrada em nome da mãe de Artur Neto, como fachada. Sediada na residência do auditor em Ribeirão Pires (SP) e sem funcionários, a Smart Tax movimentou mais de R$ 1 bilhão desde 2021, com R$ 60 milhões apenas em 2022, provenientes principalmente da Fast Shop.
Os pagamentos eram disfarçados com notas fiscais e recolhimento de ICMS, criando uma aparência de legalidade. Artur Neto controlava todas as etapas do processo, desde a coleta de documentos até a aprovação final, muitas vezes liberando valores acima do devido ou em prazos anormalmente curtos. No caso da Ultrafarma, o auditor chegou a usar o certificado digital da empresa para protocolar pedidos diretamente no sistema da Sefaz, evidenciando a profundidade da manipulação.
Empresas na Mira
A investigação, conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão à Formação de Cartel, à Lavagem de Dinheiro e à Recuperação de Ativos Financeiros (Gedec), aponta indícios de envolvimento de grandes varejistas. No caso da Kalunga, um arquivo digital enviado à Sefaz foi recusado em circunstâncias que sugerem favorecimento, levantando suspeitas de que a empresa se beneficiava do esquema. Já a OXXO, controlada pelo Grupo Nós, aparece em e-mails trocados entre Artur Neto e a Smart Tax, com documentos ligados a supostos serviços de consultoria tributária, que o MP considera uma fachada para propinas. Allmix Distribuidora e Rede 28 Postos de Combustíveis também estão sob investigação, mas não foram alvos de mandados de busca e apreensão até o momento.
O MP-SP destaca que a quebra de sigilo telemático revelou que outras empresas, de diferentes setores, podem ter adotado o mesmo modus operandi. “Identificamos que companhias de diferentes setores realizaram pagamentos dentro da mesma estratégia investigada”, afirmou o promotor Roberto Bodini ao jornal O Globo.
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Prisões e Repercussões
A Operação Ícaro resultou na prisão temporária de quatro pessoas:
Sidney Oliveira, fundador da Ultrafarma;
Mario Otávio Gomes, diretor estatutário da Fast Shop;
Artur Gomes da Silva Neto, auditor fiscal e apontado como líder do esquema;
Marcelo de Almeida Gouveia, outro auditor fiscal da Sefaz-SP.
Durante as buscas, foram encontrados pacotes de esmeraldas e grandes quantias em dinheiro na residência de Artur Neto, reforçando as suspeitas de enriquecimento ilícito. A Sefaz-SP informou que instaurou um procedimento administrativo para apurar a conduta dos servidores envolvidos e solicitou acesso às provas colhidas pelo MP-SP.
O Que Está em Jogo
O esquema expõe uma grave falha no sistema de fiscalização tributária de São Paulo, levantando questões sobre a integridade de processos administrativos na Sefaz. A manipulação de créditos de ICMS, um imposto essencial para a arrecadação estadual, pode ter causado prejuízos significativos aos cofres públicos, enquanto empresas beneficiadas obtinham vantagens competitivas indevidas. A recusa de um arquivo digital da Kalunga e as tratativas da OXXO com a Smart Tax sugerem que o problema pode ser mais amplo, envolvendo outros players do varejo.
Até o momento, Kalunga, OXXO, Allmix Distribuidora e Rede 28 Postos de Combustíveis não se manifestaram publicamente sobre as acusações. A Fast Shop informou que colabora com as autoridades, mas ainda não teve acesso aos autos da investigação. A Ultrafarma também não emitiu posicionamento.
Fonte: InfoMoney